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domingo, 21 de agosto de 2011

Napoleão e Belerofonte.


Texto escrito por volta de Dezembro de 2010.


          “Põe na boca. Pega isqueiro. Fogo. Fumaça.” - “Esses movimentos mecânicos.” - Pensou. Depois de uma longa tragada no cigarro pousou a mão sobre o joelho. Estava deitado num velho sofá de couro, com as almofadas rasgadas e puídas. Mas era o seu sofá, não iria desfazer-se dele tão cedo. A cabeça pendia para trás no encosto. Os olhos semicerrados à luz do sol, deixando-o com a vista parcialmente turva. Um braço sobre a cabeça, o outro no joelho. Segurava o cigarro frouxamente pela ponta dos dedos.
          “Põe na boca. Inspira. Solta” - Deliciou-se com a fumaça, que conforme saia de sua boca criava mirabolantes silhuetas que contrastavam à luz. As formas criadas pela fumaça dissipavam-se em segundos, assim como os seus pensamentos. Devaneava sobre infinitas coisas. Pensava, descobria e em seguida esquecia. Divagava sem rumo.
          “Inspira. Solta devagar” - O rádio tocava uma música lenta. Acordeon, percussão, violino e piano. “Essa é aquela nossa música.” - Em sua cabeça ele esquadrinhava cada passo, cada momento. Queria que essa música tocasse em seu casamento. Já tinha tudo pronto em pensamento: Haveria de ser debaixo de um salgueiro. Aquele era o momento deles, tinha de ser tudo perfeito. Lá tocariam as canções que fizeram, um para o outro. Lá trocariam as suas juras de amor. Seria perfeito. Como se o tempo resolvesse parar, para que aquela lembrança ficasse sempre gravada na memória, como uma foto que guarda bons momentos. Queria lembrar cada cheiro, cada segundo das coisas que viu naquele momento. Queria poder guardar para sempre os olhos dela. “Um olhar felino. Não de aparência, mas de atitude. Esguio, sedutor, hipnotizante.” - Queria lembrar desses olhos lhe dizendo sim. “Olhos de ressaca, cigana oblíqua e dissimulada” - Ela era sua Capitu. Sua preocupação. Sua sina. Sua paixão.
          Bateu a cinza no cinzeiro, largou o cigarro pela metade e ficou apenas ouvindo a música. Absorto em sua imaginação esqueceu-se de tudo. O tempo passou, a brasa apagou, e o sol caiu. Ainda trazia na mente o cheiro dela. Cheiro de flores, lhe causava um êxtase momentâneo. Ao abraça-la ia direto de encontro ao pescoço dela, para poder sentir aquele pequeno momento de felicidade. Ele sabia que quando abraçava-a ela inteiramente sua, apenas sua. E ficava lá, durante o tempo necessário. Tempo que para ele era demasiadamente valoroso. Era o seu tempo. “É o nosso tempo.”
          Adormecera. Sonhara com flores. Com salgueiros. Sonhara com ela. Dormira bem, dormira com a sensação de que ela era dele. Dormira com ela.

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