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segunda-feira, 5 de novembro de 2012

(des)amor

. . .again

Sua vida é a porra de um parágrafo único, escrita em uma carta dobrada dentro de um caderno, onde as folhas misturaram-se, e você não sabe o começo ou fim, comece a ler em qualquer lugar e uma hora você retornará ao mesmo, mas nesta linha você disse que o amor estava morto. Então que o amor acabe. Que venha o nojo. Venha a dor. Venham as chuvas. Esperemos que ela te diga, eu não te amo mais. Talvez você diga que não ama. Eu não diria. Então chore. Que beba, que fume. Que desatine. Que esvazie a alma, que esvazie os olhos. Mas teu peito ainda vai continuar cheio. Ela vai ligar e dizer, podemos ser amigos (?). Eu nunca procurei isso. Procuro o que então? Encontre um bar. O teto baixo, ouça o baixo. Discutindo Poe, Expressionismo e falando putaria. Você vai procurá-la. A primeira você vai dizer, oi. Oi, ela vai responder. Ela vai ser igual à outra, mesmos cabelos, mesmos olhos, quer uma cerveja? Música fluindo e o contato vem. O som está alto, chega perto de mim pra falar. Você chega. Você sente o cheiro da maquiagem no rosto dela, com base, pó, e tintas negras, ela nutre uma beleza asséptica, limpa, cheirando a creme de pele macia e completamente lisa para a noite, cabelo homogêneo, beleza homogênea no , ignorando imundice no chão, pisando em restos de cerveja melada de um copo caído ela é a contrariedade daquele lugar. Você nunca amou coisas normais mesmo. Tão limpa, no meio da imundice, cheirando à rosas em um pub sujo onde todos cheiram cerveja. Mas você gosta das contradições. Ela te pergunta o que você faz, e você diz, sou escritor. Está quente, e o resto da cerveja é só um caldo amargo de dois dedos no fundo da caneca. Mais uma? Vamos sentar? Lá fora? Você pega as duas cervejas e vocês sentam nas mesas externas. As paredes isoladas fazem apenas os graves da música serem ouvidos. Ouve o baixo? Ela não disse o que faz, e você pergunta, o que você faz? Trabalho, ela diz, diz que queria ser como você, pra viver de arte, eu pintei uns quadros, sabia? Mas arte não pagava nem os pincéis, imagine o feijão. Mas ela te perguntou, o que você faz, e você diz, o que eu faço é escrever, eu crio, eu invento, do pó eu faço as letras, do nada eu crio almas e personagens, isto é fazer, é criar, emprego não é criar, emprego é viver, me pergunte como eu vivo que eu te digo que eu trabalho, me pergunte o que eu faço, que eu te faço uma poesia. Ela vai ficar sem ar, e vai te pedir um cigarro. Eu gosto de Poe, ela diz. Você diz que é romântico. Ela diz que o amor está morto. Mas o importante não é amor, é falar dele. Vamos entrar? Ela diz que tem que ir. Então que acabe. Que deixe-a ir embora. Mas não, você diz. Volta, que eu te levo. E ela acaba na sua cama de manhã, procurando a calcinha enquanto você dorme. Ela foi, mas deixou contigo o telefone. Na semana seguinte você estava lá novamente, e conheceu a segunda, e a mesma história acontece, oi, oi, o que você faz? Escrevo, e eu trabalho. Quer uma cerveja? Eu gosto de expressionismo. E a beleza é asséptica. Você pergunta se ela quer entrar, ela diz que tem que ir. Mais um telefone. A terceira disse que não gostava de ler, não passou nem da primeira cerveja. A quarta perguntou se você usava a língua tão bem para trepar quanto usava para falar. Elas eram todas iguais. Vestiam a mesma beleza genérica. Falavam as mesmas frases de efeito manjadas. Cada semana você virava as folhas da sua carta procurando onde você havia escrito sobre amor. O amor está morto. Mas você gosta das coisas fora do normal. Toda semana você ama alguém. Ama, desama, como quem troca de roupa, encontra a princesa da sua vida, que na manhã seguinte é uma vagabunda procurando a calcinha pelo quarto. Você está vazio, amigo. Seu peito está cheio das palavras daquelas que te ligaram, eu não havia dado meu telefone? Mas você perdeu, ou diz para elas que perdeu. Quando todos estão guardados no meio de um caderno feito troféus. Mas uma delas vai ser diferente, uma delas diz que faz teatro, que não trabalha, uma delas disse que o amor não morreu, que na verdade a dor é que é velha e que pode morrer, ela vai te pagar uma cerveja e você vai pegar um cigarro dela. Na hora de ir, ela não vai, diz que vai te levar para casa. Vocês trepam a noite toda, feito macacos, gritam, arranham-se, gemem e mordem-se. Você dorme, e quando acorda ela já foi. Mas ela deixou o telefone. Ela parecia tão igual às outras, no escuro são todas iguais. Mas ela disse que fazia teatro, ela era diferente. Ela achava que o amor estava morto, e você sabia que ela não iria te ligar. A única coisa que ela te daria era uma camisinha usada, largada no chão e o telefone. E quando você tornasse a ligar, ela voltaria, e vocês novamente trepariam feito macacos, mas de manhã a cama estaria fria. Você não teria com quem sorrir, não teria para quem ligar, não teria uma amiga. O amor não é nada mais do que a companhia perfeita para você. E você ia acordar sozinho, o amor estava morto. Então você iria ligar e dizer: Ao menos nós somos amigos?

Love will tear us apart. . .


Ao amigo Guilherme.

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